domingo, 10 de maio de 2009

Apresentação 8 de Maio: “The Portable War Memorial” (1968), Edward Kienholz + “Howl” (1955), Allen Ginsberg




















Tableau: plaster casts, tombstone, blackboard, flag, poster, restaurant furniture, photographs, working Coca-Cola machine, stuffed dog, wood, metal, and fiberglass (289.6 x 975.4 x 243.8 cm) Museum Ludwig, Cologne

I saw the best minds of my generation destroyed by madness, starving hysterical naked,

dragging themselves through the negro streets at dawn looking for an angry fix;

Angel-headed hipsters burning for the ancient heavenly connection to the starry dynamo in the machinery of night. (…)

[Excerto de “Howl” (1955) by Allen Ginsberg (1926-97)]


A minha escolha do excerto do poema “Howl” pretende servir de contextualização à obra “The Portable War Memorial” (1968) de Edward Kienholz, como à Beat Generation e, em geral, a uma outra atitude e visão cultural dos EUA, discordante do status quo (patriotismo exacerbado e acrítico), abertamente crítica, subversiva e desconstrutivista (e o que igualmente fora/é designado como contra-cultura ou cultura(s) alternativas/independentes/etc.)

O poema “Howl” foi escrito no verão de 1955, em Berkeley (San Francisco Bay), e, além do seu conteúdo (“attacking what he saw as the destructive forces of materialism and conformity in the United States.”[1]), notabilizou-se pela sua forma. Howl fora concebido como um “performance piece” (texto performativo), cuja estrutura se baseia em versos a serem declamados cada um em um só fôlego. Além disso, caracteriza-se pela repetição lexical que funciona como “âncora rítmica” na posição inicial de cada verso (por exemplo, who – parte I; Moloch – parte II; I'm with you in Rockland – parte III – não presente no excerto seleccionado, mas em quase todo o resto do poema) criando um efeito de “refrão contínuo”. Uma técnica que Ginsberg iria utilizar noutros poemas seus.

“Howl” é um dos poemas mais conhecidos da “Beat Generation” (à qual estão associados além de Ginsberg, entre outros, escritores como William S. Burroughs (Naked Lunch, Junkie, Homo, etc.), Jack Kerouack (On the Road, 1957 – uma espécie de romance Road Movie – ambos referenciados no poema). A “Beat Generation” caracteriza-se pela sua escrita experimental e linguagem explícita. Muitos deles assumiram e tematizaram (na sua escrita) a sua homossexualidade (como Ginsberg em Howl e Burroughs em Homo). As suas vozes inconformistas, corrosivas e profundamente críticas da política e vida social nos Estados Unidos representam uma visão discordante da visão positivista do American Dream (o verso da medalha) e a procura de outras “filosofias de vida” (por exemplo, o budismo), inserindo-se num “movimento” anti-heróico e não-conformista, que procurava revelar o lado negativo da vida social nos EUA, personificado (nos tipos do rebelde urbano moderno “desesperado”) por exemplo por James Dean ou Marlon Brando em filmes de Elia Kazan [East of Eden (1955); A Streetcar Named Desire (1951)].

“The Portable War Memorial” (1968) de Edward Kienholz

“I would (…) never insult this country as I love it perhaps as well as you. I would, however, in my way, presume to change it.”

Excerto de uma carta de Edward Kienholz a revista Artforum em 1969


Edward Kienholz (1927-94) foi (segundo a sua autobiografia artística, marcada pela tentativa de criação de uma persona artística com toque a working class) um artista autodidacta, criado numa quinta na parte este do estado de Washington, aprendendo carpintaria, desenho técnico e mecânica, que após diversos empregos (e.o., enfermeiro num hospital psiquiátrico, manager de uma banda, vendedor) se radicou em Los Angeles, envolvendo-se aí no mundo das artes (e.o. na criação da galeria Ferus, em 1957, com Walter Hopps). A partir de 1981 passa a assinar a autoria das suas obras em conjunto com Nancy Reddin (a sua esposa e com a qual já colaborou anteriormente) e viver entre Berlim e os Estados Unidos.

Ele destaca-se de outros artistas plásticos dos EUA da sua geração (Pop Art), primeiro, pela sua estética de obra de arte total e pelo seu tom feroz, abertamente crítico - facto que provoca um certo sentimento de estranheza tendo em conta a citação da carta acima referida, mas ao mesmo tempo exprime um certo tabu patriótico dos EUA a uma crítica explícita. Mesmo assim, ele parece-me querer retratar o lado violento da realidade humana, materializando-o em tamanho real e numa estética próxima dos filmes de terror.

Esta escultura tridimensional[2] integrando som (como outros trabalhos do autor) surge em 1968, no momento em que a Guerra do Vietname se encontra no seu apogeu, e “definida” sarcasticamente pelo seu título como um “Monumento de guerra portátil”, e com as medidas aproximadas de 3m por 10m por 2,5m.

O espectador é projectado para um ambiente de consumo, solitário e despojado de seres humanos, que se parece com uma espécie de diner[3] desdobrado - com mesas, cadeiras, um guarda-sol, uma máquina de Coca-Cola, e no qual vemos uma grupo escultural representando soldados dos EUA erguendo a bandeira dos EUA, uma (re)encenação escultórica da famosíssima fotografia da segunda guerra mundial Raising the Flag on Iwo Jima de Joe Rosenthal.

Neste ambiente encontra o espectador ainda incorporadas representações de alguns ícones da cultura estado-unidense, nomeadamente - numa leitura da esquerda para a direita: uma escultura representando uma persona que seria a cantora Kate Smith[4] vestida de caixote de lixo cantando (uma gravação) do hino não oficial dos EUA: God Bless America; o cartaz “Uncle Sam - I WANT YOU” (utilizado para o recrutamento de soldados na primeira e segunda Guerra Mundial[5]); uma parede com a inscrição de 475 nações extintas pela guerra e no cimo desta parede uma cruz invertida com uma águia e por baixo desta a inscrição: «A portable war memorial commemorating VŒ Day 19Œ»[6]; uma pequena escultura representando um soldado em pose de crucificado[7] e, mais ainda, uma fotografia em tamanho real de um casal sentado a um balcão (de um estabelecimento de restauração) com um cão estofado a prolongar no espaço e na matéria esta mesma fotografia.

“Active participation of the part of the viewer has always been an integral and essential aspect of the Kienholz oeuvre.” Rosetta Brooks[8]

Kienholz cria, assim, um ambiente desolado e decadente, desconstruindo os ícones representados e a leitura deste Tableau não é de consumo fácil (fast food) como porventura outras obras da Pop-Art e como possa parecer à primeira vista. Os soldados (que não têm cabeças – ver fotografia de detalhe) e o casal da fotografia viram as costas ao espectador (Seria preciso não esquecer a gravação a acompanhar a representação da cantora Kate Smith). O espectador está a ser “ignorado” pelos representados, enquanto estes “fazem” as suas acções “absurdas” (a cantora caixote de lixo a cantar o hino, os soldados a tentar erguer a bandeira em cima de uma das mesas). Tudo isto ser projectado para um espaço de consumo não é ingénuo. Será uma insinuação, de o espaço público dos EUA, ser dominado pela “sociedade de consumo”? O espaço está cheio de objectos, mas vazio de pessoas. Muito mais seria possível “ver” nesta obra…


Yves Berndt dos Santos - nº34303



Bibliografia/sítiografia:

  1. http://en.wikipedia.org/wiki/Howl <11.04.2009>
  2. http://en.wikipedia.org/wiki/Allen_Ginsberg <25.04.2009>
  3. http://de.wikipedia.org/wiki/Edward_Kienholz <11.04.2009>
  4. http://en.wikipedia.org/wiki/Edward_Kienholz <11.04.2009>
  5. http://www.museenkoeln.de/museum-ludwig/default.asp?s=779
  6. “Good morning, my name is Ed Kienholz”. Willick, Damon. in: http://x-traonline.org/past_articles.php?articleID=48 <25.04.2009>
    http://noskoff.lib.ru/pina/KIENHOLZ/index.htm <11.04.2009>
  7. http://de.wikipedia.org/wiki/Environment <11.04.2009>
  8. http://en.wikipedia.org/wiki/Raising_the_Flag_on_Iwo_Jima <25.04.2009>
  9. http://en.wikipedia.org/wiki/Iwo_Jima <25.04.2009>
  10. http://en.wikipedia.org/wiki/USMC_War_Memorial <25.04.2009>
  11. http://en.wikipedia.org/wiki/Kate_Smith <25.04.2009>
  12. http://en.wikipedia.org/wiki/Uncle_Sam <25.04.2009>

13. http://en.wikipedia.org/wiki/Diner <25.04.2009>

  1. “Kienholz – A Retrospective” Edward and Nancy Reddin Kienholz, Ed. E Curador Walter Hopps. Whitney Museum of American Art. New York. sem data



Notas:

[2] designada como tableau (que em francês também significa quadro/pintura – outros já classificaram trabalhos artisticos semelhantes no contexto da arte do século XX como Instalação, Ambiente ou Environment.),

[3] tipo de restaurante dos EUA

[4] famosa pela sua interpretação de God Bless de Irving Berlin – hino inoficial dos EUA.

[6] Com lugares vazios a sugerir a possibilidade de os preencher para “multi-uso”

[7] “Kienholz – A Retrospective” Edward and Nancy Reddin Kienholz, Ed. e Curador Walter Hopps. Whitney Museum of American Art. New York. sem data

[8] idem


P.S. Formatação, infelizmente, não é como eu pretendo, mas não consigo (nem colocar as imagens no espaço pretendido). Desculpem

2 comentários:

  1. Gosto deste trabalho, e é pena o post não ter sido colocado aqui antes, porque seria daqueles que um tipo apreciaria comentar.
    Bom, não disse nada na aula porque pensei que talvez estivesse errado, mas afinal acho que não. Parece-me que confundiste o título do "Queer", do William S. Burroughs, com "Homo". É verdade que o livro não é grande coisa, mas ainda assim vale a pena referi-lo.
    http://en.wikipedia.org/wiki/Queer_(novel)

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  2. Olá, pois, houve um mal-entendido com o post. Eu percebi que só se podia postar após aprovação da Prof.
    Tens razão. Por engano referi o título alemão. Obrigado por avisar. Já não me lembro se li "Queer", mas penso que não. Deste período, só me lembro de ler "The Yage Letters" e "Junkie" (que achei muito interessante. Nunca injectei heroína, mas acho que ele em "Junkie" conseguiu bem convencer-nos de estar a descrever a sensação como deve ser).
    Obrigado/abraço
    Yves

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