sexta-feira, 19 de março de 2010

Dorothea Lange e Fernando Pessoa

A child and her mother, Wapato, Yakima Valley, Washington, 1939
(...)
Chove ouro baço, mas não no lá-fora... É em mim... Sou a Hora,
E a Hora é de assombros e toda ela escombros dela...
Na minha atenção há uma viúva pobre que chora...
No meu céu interior nunca houve uma única estrela...
(...)
Todas as minhas horas são feitas de jaspe negro,
Minhas ânsias todas talhadas num mármore que não há,
Não é alegria nem dor esta dor com que me alegro,
E a minha bondade inversa não é boa nem má...
(...)
O palácio está em ruínas... Dói ver no parque o abandono
Da fonte sem repuxo... Ninguém ergue o olhar da estrada
E sente saudades de si ante aquele olhar-Outono...
Esta paisagem é um manuscrito com a frase mais bela cortada...
(...)
Fernando Pessoa, "Hora Absurda"
Esta fotografia de Lange e o Poema de Pessoa tocam-se através de uma certa atmosfera de angústia, impotência e da ânsia de transpor algo que se encontra para além de si.
Na fotografia de Lange, representativa da grande depressão americana dos anos 30, temos a imagem de uma criança que se apoia numa vedação de arame com a cabeça baixa e um olhar distante enquanto é observada pela figura de uma mulher mais velha. Nesta imagem podemos facilmente notar a relação de proximidade entre estes dois corpos, mãe e filha, através da postura da mãe que observa a filha de uma forma atenta sem no entanto adoptar uma postura rígida e autoritária e sem se aproximar muito, respeitando o espaço da criança, como num gesto de protecção.
Por outro lado temos a figura da criança que se apresenta perante a lente com uma postura frágil, cansada, com os ombros descaídos e apoiando-se na cerca naquilo que poderia ser um simples gesto de apoio ou uma tentativa, mesmo que só em pensamento, de a transpor. É a imagem de uma criança que carrega um peso interior, uma desilusão, uma fraqueza mas, ao mesmo tempo, um olhar distante de quem sonha com algo melhor.
O poema em questão é um dos exemplos da escrita de Pessoa em que este se debate com a insatisfação da alma humana. É a obra de um sujeito poético que se debate com as suas limitações, tristezas e impotência de ultrapassar os limites que a condição humana lhe impõe.
Neste poema o sujeito poético vive numa luta constante para desvendar a sua identidade e debate-se com a frustração de não conseguir ser feliz por essa identidade estar perdida.
Num outro ângulo este poema abrange em si vários níveis de realidade, como a interior e a exterior, invocando imagens vindas da nossa realidade ou consciência, transformando-as e organizando-as de forma harmoniosa.
O sujeito poético da obra enumera sensações e situações que o deixam frustrado e angustiado com a sua condição cheia de limitações, dúvidas e insatisfações constantes. Durante todo o poema o sujeito debate-se com as suas ânsias como que tentando libertar-se delas e da sua condição humana que as torna reais e constantes.
Assim sendo, ambos os textos são criados numa atmosfera de desilusão, tristeza e vontade de transpor um limite que invade o sujeito poético e a criança, uma vontade de se libertarem de si próprios e das suas realidades, e nesse ponto eles encontram-se, compreendem-se e completam-se.
Bibliografia:
BARTHES, Roland, A câmara Clara, Lisboa: dições 70, 1980
SONTAG, Susan, On Photography, London: Penguin Books, 1971
PESSOA, Fernando, Obras Completas de Fernando Pessoa I, Lisboa: Edições Ática, 1980
Sitiografia:
Joana Carvalho

2 comentários:

  1. Valeu a pena reescrever o texto, Joana.

    Aponto algumas repetições desnecessárias na análise do poema, que joga mais com ideias vagas do que com uma leitura próxima do (e justificada pelo) texto. Prepare melhor este aspecto para apresentação oral.

    Bibliografia: em que medida usou o Barthes e a Sontag para este trabalho? Seu 3º link não abre.

    Espero que o seu trabalho gere comentários interessantes que a ajudem a aprofundar este diálogo.

    Diana Almeida

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  2. Ola,

    I agree with you about the disturbance in relation with the child and her's mother, caused by the disappointed, sadness after the Crisis. The girl is touching the wire. For me this wire transforms to the wall between the girl, her mother and a recipient of this image.

    I've always adored photography of Dorothea Lange. Not so long ago, I've found intersting photographies took by her: http://wyborcza.pl/duzy_kadr/1,97904,7637162,Kobiety_Dorotheii_Lange.html

    Greetings,

    Jagienka Szymańska

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