quarta-feira, 3 de junho de 2009

Terry Richardson / Eugénio de Andrade



Procura a maravilha.

Onde um beijo sabe
a barcos e bruma.

No brilho redondo
e jovem dos joelhos.

Na noite inclinada
de melancolia.

Procura.

Procura a maravilha.




Terry Richardson

Terry Richardson nasce em 1965 na cidade de Nova York.
Quando nasceu, o seu pai, que era fotógrafo de moda, estava no apogeu da sua carreira e a sua mãe era uma dançarina conhecida no circuito nova-iorquino, viviam então uma vida de jet set que muda quando os seus pais se divorciam em 1970.
Richardson muda-se com a mãe, primeiro para Woodstock e mais tarde fixando-se em Holywood, que se torna empregada de mesa e casa-se pela segunda vez.
Por volta dos seus 10 anos a mãe de Terry Richardson sofre um grave acidente que a deixa permanentemente inválida e mergulha a familia na pobreza.
Por esta altura Richardson começa a usar drogas, alcool e a consumir pornografia que lhe dava um certo sentimento de conforto. Este contexto de agrava-se quando se junta ao movimento punk.
Começa a trabalhar como assistente de fotógrafos por precisar de dinheiro e a partir desse contacto com o mundo da fotografia começa a acreditar que podia ser fotógrafo.
Começa a fotografar em 1989 e nessa altura o pai convence-o a ir para Nova York para ser fotógrafo de moda.
Em 1993 ganha o seu primeiro prémio, no Festival de la Mode, por uma fotografia publicada na revista “Vibe” e abrem-se-lhe as portas para o mundo da moda e do sucesso.
Terry Richardson tem lançado vários livros onde pode exibir o seu trabalho para além das campanhas publicitárias.




Eugénio de Andrade

Nasce José Fontinhas Rato,em 1923, na Póvoa da Atalaia, na Beira Baixa, entre o Fundão e Castelo Branco. É filho de camponeses abastados e passa a maior parte da infância com a mãe, que é frequentemente referida nos seus poemas.
O seu interesse pela literatura começa cedo e desde pequeno costumava frequentar bibliotecas públicas. Já mais tarde abandona o curso de Filosofia para se dedicar à escrita e passa trabalhar nos Serviços de Saúde, passando mais tarde para os quadros do Ministério da Saúde.
Publica o seu primeiro poema, “Narciso”, em 1939 e pouco tempo depois passa a assinar como Eugénio de Andrade. Publica o primeiro livro, “Adolescente”, em 1942 mas só em 1948, com “As Mãos e os Frutos” é que alcança o sucesso e faz amizade com Mário Cesariny e Sophia de Mello Breyner Andresen.
Não está associado a nenhuma estética literária, como estavam a maior parte do seus colegas escritores na época, apesar de aproveitar algumas influências das estéticas correntes. Como muitos escritores que começam a escrever na mesma altura que Andrade, revela que uma das suas maiores influências é Fernando Pessoa.
Eugénio de Andrade era conhecido por ser bastante recatado e discreto, especialmente no que diz respeito à sua homossexualidade.
Morreu em 2005.



Vivemos numa época em que já nada nos choca?
Um artista que nasceu e viveu numa época em que ainda se lutava pela liberdade individual, pela aceitação do que era diferente e pela possibilidade de sê-lo na plenitude e outro que pode, livremente, explorar e exibir artisticamente a sua forma de ver e pensar o mundo.
A atracção de Terry Richardson pela pornografia não é completamente oposta à atracção de Eugénio de Andrade pelo erotismo, especialmente, tendo em conta, os anos das primeiras publicações do poeta.
A fotografia de Richardson capta a homossexualidade e a ambiguidade de género duma forma muito leve e despreocupada,as pessoas parecem estar divertidas e a expressão sexual parece fácil, isso relaciona-se também com a efemeridade do sexo que é, hoje
em dia, absolutamente comum.
Culturalmente a exposição sexual é ainda um tabu, mas é já muito apreciada no contexto artístico, o que Richardson pensa sobre o assunto é o seguinte: “ I think it will become the norm for people to have cameras in their homes, documenting their sexual activity. It’s there; why not bring it out into a mainstream context?”
Pelo contrário, a sexualidade na poesia de Eugénio de Andrade surge como um envolvimento muito mais profundo e intenso emocionalmente. Parece que todas as sensações fisicas vêm da alma e no caso de Richardson vêm, exclusivamente, da carne.
Mas a verdade é que a poesia permite essa neblusidade que apazigua a verdadeira crueza do mecanismo do sexo, crueza essa que se capta em Richardson. Esta exibição erótica camuflada aparece na poesia de Andrade pelo paradigma do não-dito.
Uma fotografia sexualmente explícita implica exibição sexual enquanto que as referências sexuais num poema não significam, necessáriamente, veracidade vivênciada pelo autor ou pelo sujeto do poema.
Mas no fim de contas não são estas duas peças uma exibição daquilo que, ainda, é entendido como intimidade?
Será legitimo condenar a fotografia de Richardson como pornografia gratuita e negar-lhe, por isso, o estatuto de arte?


Bibliografia:
Richardson, Terry.TERRYWORLD.New York:TASCHEN,2008.

Sitografia:
www.terryrichardson.com
www.astormentas.com/andrade.htm
www.fundacaoeugenioandrade.pt
cvc.instituto-camoes.pt/figuras/eandrade.html

Sílvia Rocha, nº34601

10 comentários:

  1. Bom, como isto não me deixa publicar o comentário todo num, vou ter que dividi-lo em dois:

    Em relação à tua questão, «Vivemos numa época em que já nada nos choca?», a minha resposta seria um não. Para prová-lo, teria muita piada mostrares algumas das fotos do Terry Richardson na aula, daquelas fotos pelas quais o Terry (bem sei que a prof. não aprecia que tratemos os artistas pelo 1º nome, mas o Terry é um amigo da malta) é conhecido. Primeiro alguns ficariam chocados com o conteúdo, depois outra boa parte ficaria chocado com o facto de o Terry ser dos fotógrafos americanos mais populares dos dias que correm, tendo, por exemplo, parte da sua obra publicada num livro de grande formato por uma editora da importância da Taschen. Ouvir-se-ia certamente alguns “isto também eu fazia!” e outros que tais que eu já ouvi a respeito da obra dele.

    Também convém não esquecer que o Terry Richardson é, para além da coboiada toda que veremos se fizermos uma pesquisa pelo seu nome no Google, um fotógrafo cujo trabalho publicitário e de moda é muito reconhecido e requisitado. É muito interessante observar como neste tipo de trabalhos o seu estilo não se modifica (não se subjuga aos “cânones” que parecem existir na fotografia de moda), e como esse seu gosto pela pornografia e pelo excesso entram nesse trabalho que, pela sua natureza específica, será apresentado a um público muito mais extenso. Aqui, ele acaba por recorrer várias vezes, tal como o Eugénio de Andrade, à sugestão (uma sugestão claramente mais declarada, mas ainda assim sugestão).
    http://www.theage.com.au/ffximage/2006/10/04/lee_wideweb__470x319,0.jpg (muito interessante, como o fotógrafo aparece, ele próprio, na campanha publicitária, no espelho)

    A questão da intimidade também é muito boa. Assim de repente, vejo muito mais a intimidade, por exemplo, na obra da Nan Goldin, referida na última aula, do que na obra do Terry Richardson. O Terry Richardson é um pouco como o Jeff Koons naquela série de fotografias com a, então esposa, Cicciolina: trá-la para o público, ensaia-a, e a aura da intimidade perde-se necessariamente (e conscientemente) no processo.
    Mas é uma questão complexa, porque o conceito de “intimidade” não me parece muito facilmente definível. Se a intimidade é algo invisível, que pinta um momento, como pode ser transposta para uma tela ou para um poema, se a intimidade é uma vivência, um momento? Ou seja, de que forma estará lá a sua representação? Pode perfeitamente ser um momento de intimidade ensaiada. Não haverá, em princípio, garantias de que as fotografias da Nan Goldin são reais. Poderiam ser ficções muito bem ensaiadas. Já no caso do Terry, a intimidade parece-me surgir na medida em que fico sempre com a ideia de que os representados (muitas vezes ele próprio) estão a agir descomplexadamente para a câmara, criando uma espécie de cumplicidade entre eles e a câmara, e consequentemente nós, o observador da coisa. Como se estivessem no meio de uma festa e, de repente, se lembrassem de fazer parvoíces, e registassem-nas com uma câmara. Para isto muito contribui a técnica aparentemente amadora que o Terry usa.

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  2. (cont.)

    E em resposta à questão final, eu diria que não, mas também tenho a certeza que, se fizeres essa pergunta na aula, devidamente ilustrada com algumas das fotos mais incómodas do Richardson (que escolheste uma muito, muito soft), vai ser questão para gerar uma grande discussão.

    E, bom, parece ser um grande trabalho, este. Muito bem pensada, esta oposição entre os dois tipos. A maioria de nós trabalhou a semelhança entre textos, e esquecemo-nos que trabalhar pela diferença cria, muitas vezes, uma dinâmica muito mais interessante entre as coisas. E estou deliciado por teres tido a coragem para escolher trabalhar o Terry. Adoro-o imensamente, é um grande javardolas, e teve muito impacto na minha percepção do que é a arte quando o descobri, há uns anos, enquanto estudava pintura. Daí achar piada especial à tua questão final. Digam o que disserem, se é arte ou não, a verdade é que a sua obra teve influência em mim enquanto estudava numa faculdade de artes, contribuiu muito activamente para a moldagem da minha “visão artística”, e isso é sempre sinal de que a obra de um artista não foi em vão.

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  3. Bem, tive a ver algumas fotos do Terry Richardson e ao contrário do que o Zé diz não achei tão chocante, como a princípio pensei que fosse. Isto talvez se deva ao facto de que na nossa sociedade de hoje em dia a sexualidade esteja presente em tudo (seja em publicidade, em filmes, séries, etc) deixe de causar tanto choque como causa-se talvez há alguns anos atrás.
    Quanto à leitura imagem\texto existem diferenças e igualdades por assim dizer, não creio que exista uma oposição declarada (se quiseres podes elaborar mais um pouco Zé, para poder compreender melhor a tua ideia), "Procura a maravilha." vejamos, a senhora que está na foto tem uma mão num dos bolsos dos seus companheiros... com aquele ar de marota que será que ela anda a procura?
    Vai ser uma apresentação muito interessante.

    Israel

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  4. Como não poderia deixar de ser, após os comentários ds meus colegas, tive que ir ver também algumas das obras do Terry Richardson e gostei bastante do que retrata.
    Já Eugénio de Andrade é um escritor que me fascina.
    Estou bastante curiosa para ver a tua apresentação.

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  5. Para o Israel:
    É claro que não acharemos todos chocante. É lógico que não nos choca ver pessoas nuas ou a ter relações sexuais, ou seja lá o que for, porque somos produtos destas gerações muito cheias de liberdade, que sacam pornografia muito facilmente na internet, e tudo isso. Mas mesmo assim o choque existe bastante, perante a obra do Terry Richardson. Eu até falei em dois choques, o com o conteúdo propriamente dito (que é o que não te choca a ti, e ainda bem, a mim também não, mas acredita que há quem ache 'reprovável' e 'desnecessário' e vários outros 'eufemismos' do género (porque somos todos muito educados))e o com o 'isto enquanto arte'. Não tenho a mínima dúvida que haverá várias pessoas que não considerarão isto arte, se até já se questionou se a obra do Andy Warhol é de facto artística.
    (note-se que não estou a adoptar uma postura crítica relativamente a isto. Respeito totalmente as opiniões de todos)

    Quanto à ideia de oposição, parece-me surgir quando a Sílvia opõe a sexualidade declarada do Richardson à sexualidade dissimulada (escondida) do Eugénio. O trabalho dela, aliás, parece-me centrar-se um pouco nessa questão, ou seja, parece-me ser esse o foco do diálogo entre as obras que ela aqui desenvolve.
    O segundo parágrafo da última parte do texto exemplifica bem isto, quando são opostas as condições (sociais) nas quais ambos os artistas se inserem. Um existe num espaço e num tempo que não o permite trabalhar a sexualidade mais abertamente, o outro num espaço e num tempo que o permite produzir arte com uma sexualidade muito mais explícita. As diferenças que surgem a partir daí são notórias.

    Mas tanto o teu comentário como o texto da Sílvia apontam para a nossa “época”, e isso é interessante quando se fala em representações da sexualidade na arte, que hoje, como dizes, já quase perdeu o seu poder de choque. Mas terá mesmo perdido? Já sei que em todos os comentários que escrevo tenho que trazer para aqui o universo do cinema, o que sou uma seca, mas ao falar nisto lembro-me do sistema de classificações dos filmes nos EUA, que é extremamente mauzinho com filmes mais abertamente sexuais, limitando imenso o seu potencial comercial. Há um documentário sobre isso, aliás. Chama-se “This film is not yet rated”. E é lembrar, por exemplo, um filme do Larry Clark (outro fotógrafo e realizador norte-americano muito relevante, ao qual me parece que o Terry Richardson deverá alguma coisa), Ken Park, que foi banido dos cinemas na Austrália porque tem cenas de sexo oral explícitas, sem no entanto ser um filme pornográfico.

    E bem sei que estou a divagar um pouco, mas não demasiado, cheira-me.

    Ah, é verdade, falas em "a senhora", mas a mim parece-me mais um travesti, embora também possa ser um transexual, ou uma senhora com traços mais masculinos. Talvez o título da foto ajudasse a esclarecer essa dúvida.

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  6. chloe :

    Fui procurar algumas fotos do terry Richardson.
    Bastante interesante, estou contente encontrar a sua obra.
    O que me parece o mas osado na sua obra e a maneira de utilisar o corpo. Sao corpos vivos que podem ser lindos mesmo se nao tomam uma pausa fixa, algumas fotos sao quase sujas mas ainda trata-se de corpos em movimento, vivos, e por isso lindos.
    Tambem joga muito com as linhas dos corpos que fotografia, que sejam meninas perfeitas ou um gordo nudo que nao corresponde ao canao de beleza, qualquer sujeito toma, torna-se lindo.
    Acho uma fotografia boa para que a gente aceite o seu corpo assim e usa todas as possibilidades que oferece, qualquer tipo seja.

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  7. Lembro-me que no início deste milénio, num artigo da "The Face" que falava de Terry Richardson, se falava em "porno chique".

    Concordo com o Zé que encontro intimidade nas fotografias da Nan Goldin que eram/são autobiográficos. Ela fotografa-se a si e os seus amigos, basicamente. Jeff Koons é totalmente diferente. Parece-me que ele tenta chocar/provocar.

    É interessante pensar que os americanos são tão púdicos em termos eróticos/sexuais, mas tão violentos. Não haverá uma relação?
    Existe a afirmação/pergunta retórica de que quantas guerras podiam ser evitados se os presidentes teriam tido sexo (oral). Eu penso que há uma grande relação entre a nossa sexualidade ainda bastante (auto-)reprimida e o resto do comportamento humano (sendo compensação desta falta de sexualidade plenamente vivida).
    A sexualidade é (quase) sempre um acto íntimo (não falo de porno profissional), a sua exposição não. É o fosso entre representação e a vida...

    Penso que vivemos numa sociedade hiper-estimulada, mas como disse uma banda Hip Hop alemã, não é por isso que temos mais sexo. Estudos, feitos na Alemanha, até demonstram que, em comparação com, se bem me lembro, os anos 50/60, as práticas sexuais e a atitude perante o sexo, quase não mudaram. A idade de iniciação mudou dos 18 anos nas mulheres e nos homens (penso 17) para as 16 anos. Os homens cheios de testosterona só querem... (também não é verdade), as mulheres procuram o parceiro estável.
    Em Portugal reina a ambiguidade, o não assumido, brinca-se muito, mas... e penso que as mulheres ainda tentam bastante utilizar as "armas das mulheres"... ui, ui, é melhor ficar por aqui...

    Muito boa escolha, bom texto, força

    Yves

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  8. Caros colegas,
    nunca vos poderei agradecer o suficiente pelos comentários!!
    Estava absolutamente insegura para a apresentação amanhã, venho do curso de Estudos Europeus e estava assustadíssima com o facto da minha ignorância sobre arte norte-americana se notar neste trabalho. Deram-me a segurança que precisava, espero fazer uma boa apresentação amanhã!
    Amanhã abordarei algumas questões levantadas nos comentários e falarei também de algumas ideias que não constam no texto mas que fazem parte da minha interpretação destas duas peças.
    Sílvia

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  9. Sílvia. Vais levar algum livro com a obra do Terry para passar pelos colegas durante a apresentação? Tenho cá um. Se quiseres, posso leva-lo.

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  10. "A sexualidade é (quase) sempre um acto íntimo (não falo de porno profissional), a sua exposição não. É o fosso entre representação e a vida..."

    Acho engraçado que refiras um fosso entre a representação e a vida, quando falamos dos Estados Unidos da América.

    Penso que esse fosso, a existir, tenha as suas fronteiras muito pouco delimitadas. A verdade é que olhar para os E.U.A. hoje em dia é como olhar para um cosmos pop em constante mudança. Ao olhar para o tema do Sexo nos E.U.A., penso que seja importante ter em conta a mudança na mentalidade popular americana que nos trouxe a era da publicidade e da pop art, era essa em que o conceito dos "15 minutes of fame" floresceu e impregnou as gerações seguintes.

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