domingo, 10 de novembro de 2013

Comentário de Office at Night (1940)


Edward Hopper (1882-1967) destacou-se dos pintores da sua geração por assumir um estilo realista não militante, em contraste com os chamados Regionalistas, que retratavam uma ruralidade idílica e conservadora, e com os pintores muralistas, conotados com ideais socialistas. Na sua obra, o sujeito coletivo idealizado dá lugar a retratos de indivíduos solitários, por vezes, no contexto de espaços interiores demarcados por linhas arquitetónicas rígidas, como é o caso de Office at Night.
Este quadro é composto por uma série de molduras que indiciam a separação entre as figuras representadas e, em simultâneo, apontam para a própria problemática da representação, ou seja, cumprem uma funcionalidade auto-reflexiva. Cruamente iluminada, e ainda assim atravessada por linhas de luz e por zonas de sombra densa, a sala do escritório aparece delimitada, à esquerda, por uma partição e, à direita, por uma janela aberta, ecoando a porta entreaberta frente à qual se situa, num esvaziamento simbólico do espaço. As formas maciças das secretárias, juntamente com o retângulo do arquivador manuseado pela figura feminina, apontam ainda para uma espacialidade de intenções pragmáticas, despojada de subjetividade.
Como é recorrente na obra do artista, o quadro indicia uma narrativa suspensa (simbolicamente representada pela folha de papel caída no chão), pelo que nos podemos interrogar sobre os elos entre as personagens retratadas, sobretudo tendo em conta as conotações eróticas associadas ao trabalho noturno no escritório e à relação entre secretária e chefe. A figura da mulher encontra-se no ápice do triângulo que alinha a composição do quadro e, com a sua roupa justa, aliada à estranha torsão do tronco, parece oferecer-se ao olhar do espetador (como sempre colocado no papel de voyeur) e do patrão, com quem poderá estar a tentar estabelecer contacto visual. No entanto, o que prevalece é o mistério e a inelutável solidão destas duas personagens que, juntamente com a galeria de figuras da obra de Hopper, comentam a progressiva alienação do indivíduo numa sociedade desumanizada e orientada por valores materialistas.

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